Muitas vezes,
pessoas traídas perdoam e continuam com o parceiro, mas seguem
assombradas pelo fantasma da traição. Isso perturba tanto a vida
delas quanto a do casal. O segredo para ultrapassar tal situação e
a relação voltar a ser feliz é que vivam cada etapa do tudo pela
perda do antigo amor e, assim, possam construir o novo relacionamento
em bases mais saudáveis.
Diz-se que o tempo é o
melhor remédio para curar as dores de amor. Pode ser verdade em
muitos casos, mas não para todos. Parte dos traídos que continua
com o parceiro traidor encontra dificuldade para ser feliz de novo na
relação, ainda que aparentemente a situação tenha voltado ao
normal. Dia após dia, sua mente é perturbada com fatos antigos,
curiosidades ou fantasias sobre a relação extraconjugal que ficou
para trás, mas é lembrada com tanta emoção como se fosse recente.
A imaginação do traído,
então, corre solta. É comum ele se martirizar com indagações
como: onde ocorriam os encontros? O que era falado? O que e como foi
feito?
A lista das incômodas
questões não respondidas não tem fim. Junto com elas a pessoa
apresenta manifestações físicas desagradáveis, como calor, suor,
boca seca, falta de ar, tontura e às vezes até taquicardia.
Frequentemente o parceiro
traidor é instalado a fornecer mais detalhes do caso. Este, já
exausto o desanimado em virtude dos repetitivos tiroteios verbais,
ainda que arrependido pelo que ocorreu, sente que o “castigo”
passa da conta. Para o traído, de outro lado, filmes, livros,
novelas, conversas entre amigos, tudo lembra a traição. É como se
fosse perseguido pela própria história, embora tenha vontade de
esquecê-la.
A verdade é que as
situações do dia-a-dia que levam a essas associações de ideias
estão na vida de todos, mas incomodam só os que não conseguem
“digerir” a traição. A sensação é de que jamais se livrarão
do desconforto.
Não é verdade. A
dificuldade em lidar com as perdas que uma traição provoca é que
faz o traído, a despeito do tempo, despender energia na manutenção
da própria melancolia. Assim, apesar de o traidor ter desencadeado a
confusão, a solução para essa situação está também na
capacidade do traído de elaborar e superar a ideia da perda. Não
adianta obter mais detalhes sobre o que aconteceu. Mais informações
dão a impressão de maior controle sobre o ocorrido; na prática,
porém, servem apenas para alimentar a perturbação individual e a
do casal.
É necessário entender
que uma grande decepção é sentida como a morte concreta de um ente
querido e como tal deve ser elaborada. Primeiro vem o choque, seguido
de uma tentativa de negar o fato: “isso não pode estar ocorrendo
comigo... “incredulidade, raiva, revolta, depressão e ansiedade
são etapas naturais do luto, que é um recurso interno saudável
para suportar a dor e lidar com a perda. O problema é que muitos
interrompem o processo nessa fase e não saem do “velório eterno”,
já que a etapa seguinte para superar a tristeza exige do enlutado
maior capacidade de elaboração.
Para dar a volta por
cima, o traído precisa avançar e ir deixando para trás cada fase
da elaboração da perda. Em alguns casos, é necessária a ajuda de
um profissional. Ele sente que algo morreu mesmo. Não existe mais
aquele companheiro que imaginava ter, embora esteja vivo em sua
frente.
Há
sabedoria em frases como “Gostaria
de enterrar essa história de uma vez por todas”, “Quero me
livrar desse fantasma” ou “A traição foi uma morte para mim”.
De fato, mesmo com o desejo de continuar com o parceiro, é preciso
se despedir daquele amor que ficou lá atrás e “enterrar” o
passado para fazer nascer um presente e um futuro. Não se trata de
esquecer, mas de aceitar o fato e usá-lo para crescer. Não adianta
perguntar o motivo da traição, mas o porquê de continuarem juntos.
Se a decisão foi de manter a união, a energia antes direcionada a
quem não conseguiu valorizá-la deve ser reinvestida na mesma
pessoa, mas em outros moldes. Uma nova etapa com o mesmo companheiro
pode ser mais feliz. Afinal, perde-se fantasia e se ganha realidade.
Trata-se de reiniciar a união em bases mais seguras, com um parceiro
que, se por um lado causou dor, por outro pode estar disposto a fazer
nascer uma relação mais inteira.
Por:
Célia
Horta
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